sexta-feira, 30 de abril de 2010

Capitulo IX- Despedida e aliança.



Como em um espetáculo de ópera, o inverno se findou com extrema elegância, cada floco de neve desenhava claves em compasso de dança fios de melodia únicos, Lopus protegeu-me do frio, mantendo meu corpo embaixo do seu, cantando em meus ouvidos ''Far far away, no voices sounding, no one around me and you're still there; Far far away, no choices passing, no time confounds me and you're still there'' contemplei seus detalhes enquanto o inverno dançava em meus cabelos e pés como em um ritual de despedida ora suave, ora agressivo como quem não sabe o que quer, na inconstância do dever de partir, e em meu íntimo desejava que Lopus visse o quão frágil eu era e ali permanecesse eternamente.
A calmaria estabeleceu seu lugar, e quando a lua estava a pino Lopus colocou-me em segurança no alto de uma grande pedra, beijou-me a testa e lutando contra o medo e a solidão confiando em minhas linhas foram finalmente afrouxados os meus olhos.

Então Lopus disse firmemente olhando sério em meus olhos:

_Meu amor, devo agora partir, o inverno passou e ele devo seguir, te deixarei protegida e se me permitires simbolizarei nossa promessa.

Pranteei:

_Com toda certeza permito-te.

‘’Você é meu coração
O que faz que ainda exista vida em mim
Fazes meu sangue correr
Queimando minhas veias
Venho me desculpar por tão ser sua sina
Não ser o que mereces
Peço somente que nunca me deixes
Se algum dia acordares
E ver que mereces mais que o céu
Pois todo amor que tenho
Foi e sempre a ti será fiel
Posso então contemplar
O quanto preciso te amar’’
O coração de Lopus acelerou-se como nunca , sentia sua pulsação pelas palmas de suas mãos que agora afagavam meu rosto, em seus olhos eu podia ver toda a dor que partir significava para ele, seus olhos cheios de lagrimas focaram-se em meu rosto enquanto seus dedos pareciam querer gravar cada detalhe de minha textura, de meus traços... Logo se acalmou e disse:
_Oh meu amor, como poderia eu esquecer-te? Como? Se seus olhos amarelos e selvagens como Artêmis, seu nariz pequeno e delicado, seus labios macios e cheios, suas bochechas rosadas e seu corpo delineado e convidativo não saem um segundo de sequer de meus pensamentos? És por quem meu corpo queima... E meu coração ama.
Mesmo que fosse uma despedida, as palavras de Lopus acalentavam meu coração, e não contive meu sorriso. Voltando a concentrar-se disse ele a mim:
_Pois então proponho a ti, meu amor, tomes meu coração e deixe-me tomar o teu, assim mais do que palavras teremos, não precisarei de meu coração em minha sina, meu lobo vive em minha alma e meu coração só estaria em ti, não busco outros amores, busco minha missão, portanto aceite-o e deixe-me o seu para que nenhum salteador o roube com ilusões.
Consenti com a cabeça, abri meus braços e o entreguei meu coração.


Ondas de dor invadiam todo o meu corpo, como uma tsunami sangrenta que agora como propósito cada resquício de sanidade, Lopus rasgara com suas garras meu peito, tirou com suas mãos meus coração, pude vê-lo pulsante sobre o gelo, todo o mar escarlate sobre o gelo escorria como um mar de amor que nem o frio conseguia congelar,em seguida a fraqueza se expandiu amoleceram meus braços, minhas pernas, meu ossos.... Vislumbrei Lopus arrancando seu coração, seu sangue era azul e como um rio de esperança contrastava com sua face de dor, seus urros e uivos quando então colocou seu coração ao lado do meu, e colocou o meu em si, tão logo bateu eu senti ele em mim, mas em meu peito não havia o que pulsasse.


E então a fraqueza abraçou minha consciência e nada mais pude ver ou perceber, mas senti quando algo maior que meu peito parecia asfixiar minha dormência mesmo que pulsasse devagar, e então senti-me quente enquanto sentia Lopus fechando o buraco lambendo-me o seio, para que sua saliva cicatrizasse de vez seu coração, nosso coração.
Lopus estava ainda ao meu lado quando acordei tempos depois, ainda era noite, senti-me forte pela primeira vez, forte por apenas existir, então disse a ele:
_Meu Lopus, meu amor, estás bem?
Pude vê-lo esboçar um sorriso, recompor-se e dizer:
_Estou sim minha lua, e tu? Estás sentindo-se bem? Estava esperando que formasse em ti a cicatriz para que te recuperastes e pudesse ouvir de sua voz que poderia enfim, ao nascer do sol, e do verão que já findou os ventos, partir.
Procurei suas mãos, segurei-as firme entre as minhas, tomei fôlego e então o respondi:
_Estou bem meu amor, teu coração agora em mim faz-me forte, nunca estarei preparada para sua ida, mas compreendo que é necessário então agradeço seu cuidar e carinho, e digo que vás, vás e cumpra logo a tua missão, pois aqui te espero, aqui te espera teu coração.- E levei as mãos dele ao meu peito.
Lopus tremeu ao meu gesto, mas descansou suas mãos ali, e então acariciando-me desceu suas mãos até minha perna, beijou-me o pescoço, a nuca, a face e por fim lambeu-me os labios, beijou-me os labios, mordeu-me os labios e eu correspondi, coloquei em seu corpo todo meu peso e pude pela primeira vez o sentir, sentir seu toque, sua delicadeza, seu desejo, seu fogo, descobri seu corpo com os olhos, com as mãos, com todos os sentidos, beijei todo seu corpo e deixei-o também beijar-me completamente a respiração quente de Lopus em minha face despenteava meus cabelos, me estonteava, seu cheiro envolvia toda a noite como uma eternidade de paraísos, como fogo que não queima mas arde em ondas que fazem todo o corpo tremer, éramos um do outro, a despedida havia formado um novo elo e nossa testemunha única nos unia, a lua que agora dormia. Ao mesmo tempo em que Lopus abraçou-me, beijou minha face e se foi.

Capitulo VIII- Ultima Nevasca

Adormeci doce, alentada e embalada pelo respirar de Lopus, sonhos doces como lagrimas de alegria, e ao acordar ainda aqui ao meu lado estava Lopus, não porque conseguisse o ver, mas porque podia o sentir mesmo de olhos fechados.

Seus pelos afagando-me o rosto, suas mãos delicadamente acariciando-me os cabelos num desembaraço embaraçoso que se concluía em uma linda trança, e que pelo cheiro tinha rosas de inverno adornando.

Meus olhos estavam quase que libertos, minha linha de sangue e luz os sustentavam agora e não restava quase medo que perdurasse a alegria e o sustento que amparavam a mim Logo que constatado que meu amor eu veria, abri os olhos com a maior cautela possível, eu podia ver os cabelos do meu amor, seus cabelos negros como a noite e compridos como a esperança em meu peito que balançavam com o vento que anunciava mais uma ultima nevasca, seus olhos concentrados totalmente focados e vermelhos eram cobertos por uma vinca esboçada em sua testa a qual havia suas sobrancelhas juntas com forte expressão, mas logo que seus olhos vermelhos focaram os meus, puxaram-me para dentro de seu mundo de lavas que varriam meu corpo inteiro e coravam minha face, não sentia-me confortável, porém não faziam mal algum a mim, apenas dava-me segurança.

Lopus sorriu, e pela primeira vez pude ver o sol de perto, suas mãos seguraram meu rosto e seu corpo me abraçou, abraçou como se moldasse as minhas formas preenchendo-as e dando ao frio de meu corpo todo seu calor, provocou calafrios que corriam por entre meus ossos, encostou seu rosto em minha clavícula, beijou-me ali e encostando seus labios em meu ouvido disse:

_O inverno antecipou o seu fim, meu amor.

_Sinto também sobre minha uma brisa morna, mas ainda fria que anuncia a ultima nevasca, estarás aqui a proteger-me? Respondi, sem me mover.
_Estarei a proteger-te nesta nevasca, mas sinto meu amor, devo partir, acredites te amo e meu tempo contigo ainda não findou, porém sou lobo devo ir, ir a caça, ir a outras neves cumprir minha missão, devo encontrar-me para poder trazer a ti o que tanto precisas.-Disse Lopus ainda em meu ouvido.
_Não me deixe,está em ti tudo que preciso, nada mais faria sensação igual ser gerada em meu peito, nada melhoraria nosso amor, não vás, tente ficar.. E nenhuma palavra mais conseguia espremer-se e sair de minha boca, meus olhos se apertaram o medo os prendiam de novo, em prantos expirei a dor que prensava-me o peito.

Ainda calmo, com voz de sabedoria, sem se mover Lopus abraçou-me mais intensamente e disse:

_Minha amada, minha Lua, não sofras que assim chora também meu coração, pensei pronto estar porém devo minha jornada continuar só que diferente vou, agora tenho um amor, você completa a mim e me inspira a viver, obrigado por dar a mim a dádiva de chamar-te de amor.

_Amo a ti, incondicionalmente meu amor por ti excede a paixão, atravessa tudo e atinge a minha alma, minha linha, a luz e o sangue, se tens que ir não devo pedir que negues sua natureza de lobo, porém tenho algo a pedir-te e deves prometer-me que cumprirás. Pude sentir o sorriso que os labios de Lopus formaram pelo som em meu ouvido, enquanto ele se acalmava com minha compreensão.

_Diga meu amor, tão certo quanto sou lobo e cumprirei minha sina, cumprirei também o que pedes meu coração.

Tomei fôlego, seguiu-se em suspiro:

_Nunca me deixes, por mais que as noites demorem a chegar, por mais que tua sina afaste os seus caminhos de mim, nunca te esqueças de nosso amor, tenho medo de sentir-me banhada em tristeza, medo de que a solidão prenda meus braços e que a esmo fique meu coração, porém se prometeres tão certo quanto és lobo prometerei também eu, tão certo quanto te amo.

_Estarei sempre ao seu lado, se quiseres ou não, pois te amo, uma constelação não seria capaz de demonstrar a imensidão de meu amor por ti, acredite, e para provar-te eu prometo.- Lopus instantaneamente tirou meu corpo do solo, pôs-me em seu colo e continuou: _Pois então, sempre quando sentir-se mal lembra-te deste abraço e saiba que nunca vou te soltar, assim ficará tudo bem.
 Nosso silencio perdurou muito, queria que as horas passassem lentas, ao contrário de meu coração desesperado, mesmo nos braços de Lopus, desesperava era o saber que logo ele não estaria mais comigo, e nem aquecendo-me na proteção de seus braços, quentes braços.

 
A ultima nevasca aproximava-se e com ela traria não só neve, mas agudas ondas de dores.



sexta-feira, 9 de abril de 2010

Capítulo VII- Bálsamo

O vento e o frio que outrora como protagonistas tentavam me invadir, agora aparecem como coadjuvantes em pequenas porções dadas pelas frestas do contorno do corpo de Lopus a cobrir-me.
Porém enquanto Lopus estivesse sensitivo ao meu rendor, nenhum outro fator tiraria meus pés das nuvens.
‘’O seu amor é como balsamo
Percorre pelo meu corpo desinflamando toda ferida
Tirando as impurezas que um dia me perturbaram
Livrando-me de todo pesadelo e fazendo que eu viva num sonho contínuo
Seu abraço tira de mim toda dor
Tapa todo buraco que tenho em meu peito
Não posso mais viver sem ti
Sem me sentir completa, sem te amar
Se sou sua lua, seja o meu mar
Para que possamos sentir saudade durante o dia
E toda noite nos encontrarmos
Que sua imagem seja sempre refletida em mim
Olhando nos seus olhos eu possa todavia me ver
Sentir a melodia de sua pulsação
E viver de noites sem fim.’’
Em meu ser a certeza de que nada mais era igual a pele de Lópus que envolvia meu corpo não apenas o aquecendo e mantendo-me sã, mas como balsamo tocando as feridas que por fora causaram a mim, e passava por minhas veias, passava por meus olhos dando relances dourados que como lágrimas de ouro escorriam por entre minha face e morriam em meu pescoço deixando em minha boca um doce gosto longe de qualquer amargura que algum dia minh’alma teria experimentado.

Capítulo VI- Lopus

Como se estivesse esperado todo o tempo somente ouvir o meu clamor e cantar, pude sentir esse tão misterioso alguém.

Quando se calaram os meus lábios e descansei meu coração em um doce embalo e alento, em meio a todo frio da nevasca que congelava os sentidos, um arfar quente abalou-me em meio a esta prisão, entrando como se nascesse para guiar perpetuamente.

Esse arfar quente liberou em mim um ar direto as narinas, um novo sopro de vida então passou por entre meus pulmões e revirou tudo o que até então pensei conhecer algum dia.

Meus olhos até então fielmente costurados, se afrouxaram, tremi, mantive-os fechados enquanto sentia minha alma experimentar algo novo cujo nome e propósito ainda me é desconhecido, meus braços se ataram mais quase se fundindo.

Perdi-me em mim quando então fui encontrada por outro alguém.

Sua respiração se aproximava, estranhamente calma embora tivesse um novo ritmo, o ritmo que reconheci instantaneamente ser o de minha canção.

Chegando então perto de meu rosto, tocou-me uma mão cujos paradoxos pensei serem incapazes de existirem numa só matéria, rústico, quente, macio, seguro, forte e delicado. Delineou minha face parando ao queixo, parecendo reconhecer, como se estivesse observando em vida um sonho.

Nada era dito entretanto não existia o silencio, os corvos estavam anulados, as arvores descansavam num sono profundo e estático, mas agora em compasso exato, meu coração, minha linha e minha primavera acompanhavam o cantar do respirar deste alguém, até que o silêncio fora interrompido totalmente.

_Peço-te perdão se á assustei, esperei seu alento que era o momento certo cujo poderia me aproximar. Acredite, procurei a ti por muito, e essa espera destroçava-me a cada nascer da aurora.

Sua voz era como folhas de outono, suave, forte, agradável, afagadora e confiável. Não temi, logo minhas mãos se afrouxaram, mas em contradição, a canção era acelerada desordenadamente. Pude então entre sussurros pronunciar:

_Não te desculpes, lamento que meu alento tenha demorado, porém te enriqueceis com o mistério que cercava teu demorar, estás justificado.

_Eis aqui a demonstração em atos de um nada do afago que por ti sinto em meu peito.

Tentei então abrir meus olhos cuidadosamente para que a solidão não os ferissem e quebrasse então minha companhia.

Em seguida senti sua face inteira roçando-me têmpora como gesto de carinho, surpreendeu-me nossas diferenças, mas não pude evitar a torrente de compostos de alegria e aconchego que me invadiam e transbordando abriu-me um largo sorriso.

Então o não saber quis diluir minha expressão com a duvida.

_Quem és tu?
Calma e séria soou minha voz.
_Diferenciaria o conhecimento tudo que tenho destinado a dar-te?

Pude ouvir um grunhido e a neve sendo arrastada para trás, o vento então voltou a lutar contra meus sentidos batalhando a favor do entorpecer acordando em mim o pavor, que fez falhar-me voz.

_Nada poderia mudar o que tens dado a mim, mas, permita-me conhecer-te assim como sinto que conheces e mais que isto, reconheces quem sou.

Então, um golpe de proximidade fez o entorpecer perder a batalha, senti a maravilhosa trégua de paz, e perto de minha face alguém se aproximando, desta vez, tímida e ansiosamente.

_Sou Lopus.

Sem precisar de mais, senti-me completamente satisfeita, Lopus dizia tudo que eu ansiava, sem que eu soubesse anteriormente disso.
Senti um sorriso passando pela canção até mim, a neve denunciou-me um rodear e todo meu corpo sentiu que como me guardando em uma concha, fui envolta.
 
Imediatamente reconheci Lopus.
Meu Lopus.